se a água cai gota a gota
Se a água cai gota a gota
Nas palmas da noite,
Nós dizemos solidão,
Remorso, infância imolada,
Quando são, em língua de água,
Coisas de água que se dizem,
Coisas de água que se fazem.
Se o vento nos roça súbito
Como se fôssemos árvores,
Nós dizemos Profecia,
Eminente veredicto,
Quando é só lufada de ar
A desfazer-se no côncavo
Do universo vazio.
Não há perigo de que as coisas
Pelo seu lado se lembrem
De adotar o alfabeto
Das nossas metamorfoses.
Elas, antes, nos diriam:
«Bebei, bebei vossas lágrimas,
Enganai a vossa sede.»
...
Jean Rousselot
foto | Porto | março'19