Rumo ao "Doiro sublimado" a bordo do MiraDouro
Descobrir o Alto Douro Vinhateiro sobre carris já é uma experiência marcante, mas a bordo do icónico comboio MiraDouro, com as suas carruagens vintage pintadas de vermelho e branco e janelas panorâmicas, ganha outra dimensão transformando-se numa viagem única junto ao rio Douro.
O comboio MiraDouro é um comboio vintage composto por uma locomotiva modelo 1400 e carruagens produzidas nos anos 40 do Séc. XX. Outrora integradas na rede ferroviária, entre 1949 e 1977, a sua locomotiva e carruagens foram recuperadas para novamente proporcionar experiências ímpares em viagens pelos socalcos de vinha lado a lado com o rio.
Partimos da estação de Porto São Bento com destino à aldeia do Pocinho, no concelho de Vila Nova de Foz Côa, e regressamos no final do dia. Foi uma viagem de três horas e quarenta minutos de um extremo ao outro, onde a malha urbana aos poucos deu lugar aos vinhedos e majestosos socalcos durienses sempre serpenteado pelo rio, por vezes tão próximos que quase lhe sentimos a frescura.
Foi um avivar de memórias da infância, tantas e tantas vezes o comboio foi o meu transporte até ao Tua a caminho da aldeia natal do meu Pai. Curiosamente, tal como nas minhas viagens de outros tempos, o comboio sobe e desce lotado, embora agora os muitos turistas, que apreciam as singulares paisagens, se misturem com as gentes dourienses que o utilizam nas suas deslocações diárias ou ocasionais.
Já Miguel Torga dizia que o Douro é um exagero da natureza!
O Doiro sublimado. O prodígio de uma paisagem que deixa de o ser à força de se desmedir. Não é um panorama que os olhos contemplam: é um excesso de natureza. Socalcos que são passados de homens titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor pintou ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares plausíveis de visão. Um universo virginal, como se tivesse acabado de nascer, e já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza absoluta.Miguel Torga in “Diário XII”