que fizemos das árvores?
Que fizemos das árvores? Era fácil pousar
o ouvido num ramo que de longe trazia
do fundo da infância os búzios encantados
porque as árvores eram coisas que diante de nós
estavam acontecendo num incrível passado
Uma peste com asas ensaiámos nos tubos
de um ódio que à estrela feroz dos nascimentos
a vida que nos deu não pode perdoar
e ante a nossa presença se contorcem as árvores
com romanzas de folhas brutalmente caladas
pela estratégia sombria das piranhas metálicas
que para o pesadelo de um ouro demoníaco
arrastam a carcaça do verde e dos céus sáfaros
como pétalas podres caem mortos os pássaros
e à febre das areias que deliram ao sol
arremessam as águas primeiras do dilúvio
as espinhas dos peixes que dos bruscos terraços
das ondas se despenham em luas de petróleo
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Natália Corrreia
foto | Alagoa | março17
texto | in "Antologia Poética - Natália Corrreia | D. Quixote | 2013